Vai hoje a sepultar, aquele que foi uma das grandes referências de uma certa ideia de Europa Unida que não chegou a existir. Uma Europa de pátrias e de nações, imbuída daquele sentido de pertença que outrora de Lisboa a Varsóvia, todos considerava como partes de uma Respublica Christiana.
Homem invulgar e pouco compreendido or quem hoje se rende a cocktails e aos acenos a patéticas sumidades de incerta futura reputação, Otto von Habsburg foi talvez o derradeiro representante de um espírito de missão próprio da era medieval, abdicando do conforto ou da glória pessoal, mas jamais da obrigação do cumprir de um dever que julgou sagrado e acima das contingências da baixa política e dos ciclos económicos ou de guerras que sempre combateu.
Dele para sempre me ficará na memória, a afabilidade e o interesse mostrado por um rapaz português que no já longínquo ano de 1983 e em representação da então Nova Monarquia se dirigiu a Fulda, participando numa grande reunião da União Paneuropeia. Procurando falar no hesitante português que ainda recordava, naquele fresco Domingo passado a bordo de um navio de cruzeiros no Reno, Otto questionou-me longamente acerca de Moçambique e com a curiosidade que foi sempre a sua base essencial para o conhecimento, mostrou um inesperado e surpreendente interesse acerca de uma família que deixara a Europa quando ainda reinava em Viena o seu tio-bisavô, o Kaiser Francisco José. Teceu algumas considerações resignadas sobre uma forma de descolonização que julgava como um tremendo erro que atingia a Europa como um todo, espantando-me com a sua perfeita consciência acerca dos momentos por nós vividos no PREC. De Portugal conservava a gratidão nostálgica da sua infância no exílio e tinha um certo sentimento de pertença a uma já desaparecida consciência deste país e do seu povo. Falou-me da sua viagem à então África Portuguesa, onde visitando um chefe tribal, foi tratado como um membro da família, pois sendo parente muito chegado dos nossos Reis, beneficiou daquela rara distinção que o tornava num igual, num primo. Coisas portuguesas, talvez inconcebíveis por muitos europeus que ainda não compreenderam que o nosso fugaz momento de pouco mais de dois milénios, já terá terminado. Aquela conversa que também contou com a participação da sua filha mais militante pela Causa, a Arquiduquesa Walburga, chegou a um certo ponto onde alguns temas, completamente imprevistos pela evidente intimidade, levaram o grande Homem a discorrer sobre as suas relações familiares, tendo a Arquiduquesa dito peremptoriamente que o seu pai era ..."o mais Bragança de toda a família. Sai à minha avó Zita". Era verdade e podemos dizer que se celebram exéquias por um notável membro da grande Casa de Bragança. Otto de Habsburgo-Lorena descendia de Dona Maria II pela linha paterna, enquanto a mãe, a Imperatriz Zita, era neta de Dom Miguel I e prima direita de Dom Duarte Nuno.
Se a Áustria-Hungria pode ser considerada como uma pujante precursora imolada no altar do egoísmo e da vingança de vencedores sem visão, Otto - aquele que nada temeu e soube enfrentar as grandes tiranias do século XX - poderia muito bem ter sido a primeira pedra de um edifício que hoje, quase todos duvidam ter qualquer possibilidade de construção. Nestes dias do fim, mal suportamos um quase hortícola Rompuy, quando podíamos ter simbolicamente iniciado um outro caminho com aquele que descendia de Otto I o Grande, de Dom Afonso Henriques, S. Luís, Carlos V, Dom João IV, Luís XIV e de mulheres como Dona Filipa de Lencastre ou a Imperatriz Dona Maria Teresa.
Estado Sentido
30 de Dezembro de 1916, Otto nas cerimónias da coroação de seus Pais como Reis da Hungria
5 comentários:
Guta,
A musica do seu video é a mesma desta : http://www.youtube.com/watch?v=-Atv5j-BjlI&feature=related
O Hino do império Austro Hungaro tinha a mesma musica que tem hoje o hino da Alemanha?
Zé Tomaz,
Eu penso que como SAIR Otto Habsburgo desde 1954 que vive na Alemanha (Bavaria)na residência Vila Austria e como tal tornou-se cidadão da Alemanha, Austria, Hungria e Croácia. Será por isso que os hinos são os mesmos?
Não! Este hino foi composto por Haydn (http://www.nationalanthems.info/ath.htm), em honra do Imperador Francisco II do Sacro Império Romano Germânico. Quando o Império foi dissolvido na época das guerras napoleónicas, surge o Império da Áustria e Francisco II passa a ser o primeiro imperador do novo Império. O "Deus Salve o Imperador" continua como o hino do Estado e assim fica até à queda do Império em 1918. Desde o fim do século XIX, existia uma versão cuja letra era cantada pelos pan-germanista que substituíram o Deus Salve o Imperador, por "Deutschland übber Alles". Esse foi o hino adoptado pela república alemã e mais tarde pela III Reich e pela Rep. Federal. O antigo hino alemão era o Heil dir im Siegerkranz (http://www.youtube.com/watch?v=IjJa3_dR5Ac), cuja música é a mesma do God Save the Queen. Esta melodia também é a mesma usada pelo Liechtenstein e até há uns 40 anos, pela Suíça. Grande baralhada, não?
Em suma, os alemães roubaram o hino aos austríacos que se deixaram despojar, tendo hoje um hinozinho sem grande interesse ou grandeza (http://en.wikipedia.org/wiki/Land_der_Berge,_Land_am_Strome), mas que alguns atribuem a Mozart.. Não é grande coisa, se o compararmos com a obra de Haydn (http://www.youtube.com/watch?v=f-GJo3cSjdw).
Mas que grande confusão! Claro que a Alemanha como república tinha que roubar... faz parte das repúblicas...
Obrigada pela explicação.
Grande Nuno
Obrigado pelo teu excelente esclarecimento. És uma enciclopédia.
Abraço amigo
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