segunda-feira, 29 de julho de 2013

S.A.R., DOM DUARTE ESTEVE PRESENTE NO CONGRESSO "A ORDEM DE CRISTO E A EXPANSÃO"

Os crioulos cabo-verdianos Cavaleiros da Ordem de Cristo, ao candidatarem-se, eram muitas vezes rejeitados por questões de “pureza de sangue” mas nem sempre os óbices provinham dos seus antepassados africanos mas sim dos portugueses, defendeu a historiadora Teresa Neves, que dissertou na Sociedade de Geografia sobre “Os Cavaleiros da Ordem de Cristo nas ilhas de Cabo Verde (séc. XVI a XVIII)”. Na plateia, um ouvinte ilustre, Dom Duarte Pio de Bragança, Herdeiro do trono de Portugal.
A comunicação inseriu-se no congresso “A Ordem de Cristo e a Expansão”, em Lisboa, a que foram apresentadas 42 comunicações de historiadores reconhecidos, de várias nacionalidades.

Maria Manuel Torrão, por exemplo, falou sobre “Negócios negros para a obtenção de uma cruz: Mercadores negreiros na senda dos hábitos da Cruz de Cristo”.

Segundo ela, obter um título de nobreza era uma recompensa por serviços prestados à Coroa e os traficantes de escravos ambicionavam-no. Conseguiam-no muitas vezes porque o comércio humano proporcionava-lhes grandes lucros, o que lhes permitiu por vezes socorrer casas reais com problemas financeiros.

Não eram todos obrigatoriamente de origem portuguesa. O negreiro António Torres e os seus dois irmãos, por exemplo, provinham de Castela mas fixaram-se em Portugal.

Em determinada altura, António Torres residiu mesmo em Cabo Verde, que lhe servia de escala para o transporte de escravos entre o Golfo da Guiné e o continente americano, nomeadamente Antilhas e Honduras. Acabou por ser recompensado pelo rei D. João III que o nobilitou.

Teresa das Neves salientou que, até ao final do século XVII, os governadores de Cabo Verde eram todos membros da Ordem de Cristo e levavam para ali, nas suas comitivas, não só familiares como amigos, também eles membros da Ordem.

Eram vistos como representantes reais, com o estilo de vida da nobreza, vivendo dos rendimentos.

Cabo Verde teve várias gerações de Cavaleiros da Ordem de Cristo, uns nascidos no Reino de Portugal, outros já em Santiago e que descendiam de um governador que, ao contrário de outros com o mesmo cargo, viveu ali dez anos, casando os filhos com mulheres ali nascidas. Prestavam serviços à coroa com milícias a cavalo e escravos, pagos por eles, acabando por ser ressarcidos com a Ordem de Cristo.

Ao candidatarem-se, enumeravam os serviços prestados, como as suas façanhas no combate à pirataria que assolava o Arquipélago.

A Mesa da Consciência examinava depois, minuciosamente o perfil dos candidatos, nomeadamente a “pureza de sangue”.

No caso de Pedro Cardoso do Amaral (séc.XVIII), nascido em Santiago mas descendente de um madeirense de apelido Bezerra, foi-lhe apontado como obstáculo ter um avô reinol (nascido no reino) casado com uma mulher de “segunda condição”. Para André Alvares de Almada (1598-1603), também nascido em Santiago, foi alegada a existência de uma avó negra.

Sobre Pedro de Barros (séc.XVII) recaíram suspeitas de ser cristão novo (judeus convertidos).

Nestes três casos, as objecções foram rejeitadas e os candidatos receberam a recompensa dos seus feitos.

Uma constante das várias comunicações apresentadas foi o financiamento da evangelização.

Francisco Figueira de Faria, ao dissertar sobre “O padroado, a Ordem de Cristo e o financiamento das missões ultramarinas” considerou ter sido “cómodo” para a Santa Sé delegar nas coroas ibéricas a evangelização dos territórios ultramarinos.

Por seu lado, os reis que tinham de suportar os numerosos encargos dessa missão, nomeadamente a construção de igrejas, tinham de “rentabilizar ao máximo os seus investimentos” mas, mesmo assim, o financiamento era sempre “parco e tardio”.

A diocese de Cabo Verde, criada em 1533 chegou a incluir para além da Sé, igrejas e capelas, um palácio episcopal. No início do séc. XVIII, já os filhos da terra monopolizavam o clero local, depois de esses lugares serem providos por concursos anunciados em editais locais.

Criada em Portugal em 1319, a Ordem de Cristo teve um papel determinante na evangelização dos povos contactados, especialmente entre os séculos XVI e XVIII. O seu símbolo, uma cruz, marcava as velas das caravelas portuguesas.

Para o Professor João Pereira Neto, muito do que foi dito nas comunicações explica em grande parte o que se passava na administração colonial que encontrou no Arquipélago de Cabo Verde no séc.XX: “São as raízes do Portugal profundo. É o Portugal que fomos até há pouco tempo, o que somos e que, se calhar, outros virão a ser “.

No período de perguntas da assistência, Dom Duarte chamou também a atenção para o facto de ainda hoje nas cerimónias no Brasil, a bandeira da Ordem de Cristo ter precedência sobre as outras.

Ao responder, a historiadora Maria João Soares lembrou que alguns documentos antigos referem as terras do interior do Brasil como pertença do rei, não como monarca mas por ser o administrador da Ordem de Cristo.

A Ordem de Cristo foi criada em 1319 para substituir a Ordem dos Templários mas foi com os Descobrimentos e o Infante D. Henrique que atingiu o apogeu.

Entre os membros mais famosos da Ordem de Cristo, destacam-se Vasco da Gama (descobridor do caminho marítimo para a Índia), Pedro Álvares Cabral (que aportou ao Brasil) e Bartolomeu Dias (o primeiro europeu a chegar à costa da Namíbia e ao Cabo da Boa Esperança, na África do Sul, onde anos mais tarde viria a morrer num naufrágio, e que colocou padrões em pedra ao longo da costa, nomeadamente a Norte de Angola, no Cabo da Volta, hoje chamado Dias Point, no Congo).

O património da Ordem incluía o Convento de Tomar, a sua sede, o Castelo de Almourol e a Torre de Belém, entre outros monumentos portugueses.

Quando a Ordem foi extinta em 1834, os seus bens foram expropriados e vendidos mas, em 1918, foi restabelecida para “premiar os serviços relevantes de nacionais ou estrangeiros prestados ao país ou à humanidade, tanto militares como civis”.

A Cruz de Cristo, como é vulgarmente designado o seu emblema, é ainda hoje usada como símbolo pela Força Aérea Portuguesa, pelas selecções de futebol de Portugal e do Brasil e pelo Belenenses, figura na bandeira ou no brasão de vários municípios brasileiros.

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