domingo, 18 de julho de 2010

DOM DUARTE DE BRAGANÇA, O REI QUE NÃO TEMOS
Dom Duarte é um homem simples, apegado à Natureza e a uma vida tranquila, sem espalhafato. As portas da bela casa da Rua do Campo, em Sintra, abriram-se-nos afavelmente. Numa enorme sala em que ardia o fogo acolhedor de uma lareira. Dom Duarte, Duque de Bragança, o sucessor dos Reis de Portugal, recebeu-nos com toda a cordialidade. A sua presença é extremamente agradável. É alto, aloirado, risonho, e fala com enorme facilidade. Sente-se nele, um defensor da liberdade. Por ela, com efeito, tem lutado, em todas as situações da sua vida. É formado em Agronomia, foi oficial piloto-aviador em Angola, e lá, tentou formar uma lista de candidatos independentes à Assembleia Nacional, tendo por essa razão sido expulso desse território, pela PIDE-DGS.
Para iniciar a entrevista que nos concedeu, perguntámos a Sua Alteza qual a sensação que lhe produz a difícil transição que o nosso pais atravessa.
- Estou convencido que todo o Ocidente está em face de uma mudança que pode ser brutal ou muito suave. Pode acontecer que haja uma guerra noi próximos anos e, neste caso, a Europa não tem condições de defesa. Se isso viesse a acontecer, Portugal ficaria bastante isolado, teria que suprir-se a si próprio, e passaria-mós obviamente muito mal. Deveria, preparar-se o pais para ele poder sobreviver isoladamente. Isto è certamente mais importante do que a entrada para o Mercado Comum ou outras organizações internacionais, que tem as suas vantagens mas não é tão vital como a sobrevivência física de todos nós. Ninguém ignora que o que tem vindo a equilibrar a nossa balança económica tém sido os emigrantes e os turistas. Se, de repente, ficarmos isolados, não somos capazes de nos manter. Ora, se temos de contar com as Forças Armadas, para a defesa do território. por outro lado, temos de contar com a Agricultura. Mas, os agricultores continuam a ser uma classe extremamente desfavorecida, e o que vale à economia política portuguesa é que o pequeno proprietário agrícola não faz contas.
Sabemos que Vossa Alteza é Presidente da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de Nelas. Quer falar-nos da importância dessas caixas?
-Ironicamente e um pouco demagogicamente diria que os bancos são organizações que tomam emprestado o dinheiro dos pobres para emprestar aos ricos, e pagam barato pelo dinheiro que recebem e fazem-se pagar caro pelo dinheiro que emprestam, e as pessoas sentem que já é tempo de não deixarem os seus créditos por mãos alheias. Criaram-se em tempos as Caixas de Crédito Agrícola que se têm desenvolvido muito. Temos em Portugal cerca de duzentas com dezenas de milhares desócios.
Vossa Alteza mencionou dois pontos de que gostaríamos que nos falasse: a guerra e o turismo. Que opinião temsobre a guerra nuclear?
- Acho que não tem importância porque ninguém está interessado nela. Só se houver um louco que resolva deitar uma bomba por razões de desespero. — Quanto ao turismo... — Houve um político qualquer que disse que o turismo é a prostituição de um povo, o que evidentemente é um exagero. Mas tem incovenientes. Um deles é estar-se dependente de uma clientela muito flutuante, o outro é contruirem-se hotéis feiíssimos e estragarem-se paisagens sob pretexto de turismo. Pergunto: o que iremos oferecer ao turismo se a nossa paisagem rural e litoral ficar completamente desfigurada? Isto acontece por culpa de certas administrações, que não são capazes de controlar o estilo das construções. Às vezes por incompetência ou por fraqueza, ou por ausência de normas claras, deixam fazer tudo. E nas aldeias os emigrantes são explorados por muitos construtores que os levam a gastar fortunas para construir casas péssimas e ridículas. Quem viajar pelo Minho ou a Beira Alta quase não encontra uma aldeia que não esteja desfigurada por casas que parecem mostruários de azulejos, autênticas casas de banho viradas do avesso...

Quer falar-nos agora da juventude portuguesa. Senhor Dom Duarte? - A juventude tem sempre tendência para estar insatisfeita com o que se está a passar, o que ê saudável. " Procura tornar-se. independente da geração dos pais. Essa fase manifesta-se de todas as maneiras: comportamentos anti-sociais, um certovandalismo... Por outro lado, quando os jovens são orientados no sentido de manifestarem a sua vontade de acção em campos mais positivos — e quero mencionar, por exemplo, o serviço cívico — tornam-se mais responsáveis. Lamentavelmente, os programas escolares contribuem muito para manter os jovens à parte da vida real. O programa escolar devia ter uma visão mais global e mais prática e isto não acontece só na primária, mas também no Liceu e até na Universidade.
Fale-nos agora da mulher, Senhor Dom Duarte.
- Parece-me que as mulheres do campo têm uma vantagem sobre as das cidades. O seu nível de cultura é muito mais próximo do marido. Ela com participa mais na vida dele. Nas cidades, as mulheres têm uma certa tendência a considerarem-se intelectualmente menores. Deixam-se ficar com uma cultura extremamente superficial: lêem fotonovelas, vêem telenovelas. mas não é culpa sua que a televisão escolha programas especialmente maus para as horas de grande audição. Isso ê culpa dos dirigentes da Televisão. Independentemente desta pequena crítica, há que fazer justiça à mulher que, nas épocas de crise, dá exemplos de coragem e de coerência muito superiores ao homem, que se deixa mais facilmente assaltar por uma certa histeria colectiva que se apodera de um pais. Além disto, é à mulher que se deve a educação básica do homem. São as mães que dão ao futuro cidadão o seu equilíbrio e o seu sentido cívico. Esse papel é importantíssimo para o equilíbrio social de um pais.
Para terminar, quererá Vossa Alteza dar-nos uma visão do que gostaria que fosse o mundo?
- Sinto-me um pouco tentado a citar o que o Papa João Paulo II disse no Natal: «Quando se afasta Deus da nossa vida particular, o mundo invivi-vel». Quem falar em casos de fanatismo, entendo que os lugares onde ainda se pode viver são aqueles em que Deus tem o seu lugar.
Era tempo de deixarmos a casa de Sintra, onde a hospitalidade de Sua Alteza Real o Duque de Bragança, nos proporcionara. Na viagem de regresso, recordámos uma bela frase da sua mensagem e sentimo-nos mais confiantes no futuro.
«O nosso povo pode vencer todas as crises se souber encontrar o caminho que conduza à recriação de Portugal.»
"Crónica Feminina" de 11 de Fevereiro de 1982
Fonte: Monarquia - www.monarquiaportuguesa.com
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