Em Março de 1977, S.A.R., Dom Duarte dirige a Primeira Mensagem ao país, como Herdeiro do Trono de Portugal: "Farei do cumprimento desses deveres a razão da minha vida..."
Ao Povo Português
Aos Povos dos Novos Países de Expressão Portuguesa
Às Comunidades de Raiz Lusa do Mundo Inteiro
Na véspera de Natal do ano findo, ao falecer o meu querido Pai, o Senhor Dom Duarte, Duque de Bragança, encontrei- me investido na chefia da nossa Família e na Representação do Princípio Monárquico, sobre o qual a Nação Portuguesa se organizou, consolidou e desenvolveu, projectando no Mundo benefícios e valores indiscutíveis. Assim, por força de uma sucessão dinástica a que me sinto completamente vinculado, achei- me perante deveres recebidos de meu Pai e dos Reis de Portugal, nossos Antepassados, que a eles nunca se escusaram.
Sejam quais forem as circunstâncias, tais deveres não prescrevem pois constituem a justificação essencial do Princípio que represento; a Instituição Real explica-se por uma dádiva total ao País, para além da existência ou inexistência do Trono. Os Reis e os seus Herdeiros nascem para servir a colectividade e para amá- la, reinando ou não, em mandato natural que não cessa de obrigá- los e, todavia, deve afastá - los da competição pelo Poder.
Atentos à vontade do Povo, livremente expressa, poderá caber- lhes reinar, mas jamais disputar; explicam- se para unir, no Trono ou na vida mais discreta, no devotamento público ou na dedicação mais silenciosa. Se de tal forma procederem, serão sempre coerentes face à Realeza que detêm, independentemente do respectivo exercício.
Farei do cumprimento desses deveres a razão da minha vida, não esquecendo que a Instituição Real, como elo entre o Passado, o Presente e o Futuro, tem uma função de síntese e obriga a visão conciliadora, onde, por vezes, se tenham cavado notórias diversidades. Não estranhareis, assim, o meu cuidado em dirigir-me a vós no imenso conjunto formado por este Povo antigo, pelos Povos dos novos Países de expressão portuguesa e, de modo geral, por todas aquelas Comunidades que na Europa, em África, na Ásia, na América e na Oceânia guardam raízes culturais e formas de sentir que nos irmanam, mesmo para além das alterações mais recentes e, por isso, mais vivas. Não poderia dirigir- me apenas ao Povo Português nos seus limites geográficos quase iniciais, muito embora sejam para ele, naturalmente, a minha primeira dedicação e a minha fidelidade total. Se tal fizesse, faltaria à amplitude do Princípio que encarno, traço de união no tempo, permanência no desenvolvimento das circunstâncias, sinal de identidade nas separações. Embora na devida consideração pelas soberanias dos novos Países de expressão portuguesa, consciente de realidades bem patentes e da sua irreversibilidade, não poderia deixar de me dirigir aos respectivos Povos neste meu primeiro acto formal: jamais deixarei de olhar- vos, meus irmãos na expressão lusa, com a imensa afeição com que sempre o fiz, sem paternalismo, mas antes na perspectiva de quem, personificando valores comuns, vos encara e à Nação Portuguesa, como indissoluvelmente ligados. As nossas fisionomias nacionais não seriam o que são caso não tivéssemos vivido, durante séculos, um Destino comum. Nada conseguirá apagar esta realidade em todos nós! Ao ver, ao ouvir e ao sentir Portugal, vejo- vos, ouço- vos e sinto- vos sempre; foi sobretudo através das vossas Terras que nós, Portugueses, sentimos a Terra inteira. Tenho fé em que distinguireis um dia, serenamente, entre colonialismo e colonização (correspondente, esta, a movimentos naturais dos povos) e atingireis a conclusão de que Portugal foi no Mundo um obreiro de experiências ímpares, de que muito haveis beneficiado. Tenho fé em que encontraremos, no futuro, fórmulas de convívio também excepcionais, assentes no respeito pelos direitos dos Estados e cimentadas pelo património lusíada e pelas vossas culturas.
Desejaria de todo o coração que esta minha fé fosse partilhada por todos os Portugueses! Desejaria ver- vos, meus Compatriotas, completamente libertos de uma certa má consciência que, a dado momento, vos foi instilada... Má consciência que minou o justo orgulho por quanto, ao longo de séculos, foi tarefa colectiva Além- Mar. Desse sentimento de frustração, insinuado entre nós havia muito, aproveitou um processo de «descolonização» que, por mim, prefiro não qualificar; a Nação Portuguesa o fará, se acaso o não fez ainda, como também sucederá ou já sucedeu com os próprios Povos dos novos Países de expressão portuguesa. Em vós, saúdo a Grei magnífica, humilde e grande, sofredora e combativa, que na força das suas virtudes e na humana crueza dos seus defeitos marcou de forma excepcionalmente positiva uma presença por onde quer que tenha passado, escrevendo comunicação na História como mais ninguém soube fazê- lo.
Assim, dizendo, recordo certas Comunidades de raiz lusa, como Goa, Damão e Diu, e lembro dolorosamente o Povo de Timor, traído na sua aspiração de Portugalidade. Com mágoa funda e a mais fraterna solidariedade, dirijo uma saudação especial àqueles Portugueses das mais variadas etnias que, atingidos por um processo de descolonização sobre o qual não lhes foi feita qualquer consulta, sofrem entre nós, a amargura das suas vidas destroçadas e as dores da saudade: ânimo, meus Compatriotas, pois muito tereis a dar e a receber neste velho País! Sede pacientes e guardai a cabeça levantada pelo muito que haveis feito; os factos vos darão, também aqui, ensejo de utilizardes a grande riqueza da vossa experiência e da vossa abertura.
O equilibrado orgulho, a convicção de nós próprios, o sentido de uma identidade nacional são- nos fundamentais na fase histórica que atravessamos. Nenhum Povo digno desse nome se apresentou jamais perante a História ou perante a Comunidade Internacional como réu do seu Passado! Tal equivaleria a pedir desculpa de existir... É necessário que tenhamos consciência disso para podermos preservar a nossa fisionomia e realizar, sobre nós mesmos, um exame de consciência, uma reforma da mentalidade, direi mesmo uma pedagogia colectiva. Disso carecemos para conseguirmos, enfim, rever sem espírito destruidor, reconstruir sobre valores imperecíveis, dialogar sem a brecha da malquerença, reformular sem criar situações de vácuo, defender a liberdade sem resvalar para a demagogia. Nesta se instalam as tentações totalitárias e se insinuam os messianismos ditatoriais, que as gentes fatigadas e desejosas de ordem acolhem com natural alívio para, depois, perigosamente neles delegarem a consciência.
Ao dirigir- vos estas palavras, interrogo- me sobre se serão elas, efectivamente, as que muita gente esperaria ouvir de mim. Em consciência, sei serem as que me competem. Notai bem que não sou chefe político. Não me identifico com partido algum. Não procuro propagandas eleitorais, nem dependo delas. Não me cabe, em suma, fazer política na acepção comum da palavra. O Herdeiro dos Reis de Portugal não tem que pretender; ele detém a Representação imprescritível de um Princípio, cabendo- lhe aguardar quanto os Portugueses possam, porventura, decidir sobre as Instituições. Não cabe à Realeza imporse, mas sim escutar o chamamento do Povo. Não me cabe pois pretender; cabe- me estar ao vosso dispor. O Rei só se justifica como Chefe livre de uma Nação livre. Para que ele possa ser livre, é imprescindível que a Nação o consagre em liberdade, ou por amor da liberdade, como aconteceu com El- Rei D. Afonso Henriques, com El- Rei D. João I e com El- Rei D.João IV.
Nas circunstâncias actuais, cabe-me prestar em interessada abstenção o meu desvelo a todos os Portugueses, de quaisquer correntes políticas, desde que respeitem e preservem a independência da Pátria, sirvam o interesse colectivo, cumpram os deveres inerentes à cidadania, no usufruto da sua liberdade, respeitem a liberdade dos outros e reconheçam a dignidade transcendente da pessoa humana. Integrado neste Povo de que sou parte, cabe me servi- lo por todos os meios, consoante a lição recebida dos meus Antepassados e vivida no dia a dia da minha Família, com a elevação inerente à Instituição que personifico. Tal me obriga a uma dádiva aberta, a uma militância constante ao serviço do interesse nacional, a uma disponibilidade discreta mas atenta.
Aos Povos dos Novos Países de Expressão Portuguesa
Às Comunidades de Raiz Lusa do Mundo Inteiro
Na véspera de Natal do ano findo, ao falecer o meu querido Pai, o Senhor Dom Duarte, Duque de Bragança, encontrei- me investido na chefia da nossa Família e na Representação do Princípio Monárquico, sobre o qual a Nação Portuguesa se organizou, consolidou e desenvolveu, projectando no Mundo benefícios e valores indiscutíveis. Assim, por força de uma sucessão dinástica a que me sinto completamente vinculado, achei- me perante deveres recebidos de meu Pai e dos Reis de Portugal, nossos Antepassados, que a eles nunca se escusaram.
Sejam quais forem as circunstâncias, tais deveres não prescrevem pois constituem a justificação essencial do Princípio que represento; a Instituição Real explica-se por uma dádiva total ao País, para além da existência ou inexistência do Trono. Os Reis e os seus Herdeiros nascem para servir a colectividade e para amá- la, reinando ou não, em mandato natural que não cessa de obrigá- los e, todavia, deve afastá - los da competição pelo Poder.
Atentos à vontade do Povo, livremente expressa, poderá caber- lhes reinar, mas jamais disputar; explicam- se para unir, no Trono ou na vida mais discreta, no devotamento público ou na dedicação mais silenciosa. Se de tal forma procederem, serão sempre coerentes face à Realeza que detêm, independentemente do respectivo exercício.
Farei do cumprimento desses deveres a razão da minha vida, não esquecendo que a Instituição Real, como elo entre o Passado, o Presente e o Futuro, tem uma função de síntese e obriga a visão conciliadora, onde, por vezes, se tenham cavado notórias diversidades. Não estranhareis, assim, o meu cuidado em dirigir-me a vós no imenso conjunto formado por este Povo antigo, pelos Povos dos novos Países de expressão portuguesa e, de modo geral, por todas aquelas Comunidades que na Europa, em África, na Ásia, na América e na Oceânia guardam raízes culturais e formas de sentir que nos irmanam, mesmo para além das alterações mais recentes e, por isso, mais vivas. Não poderia dirigir- me apenas ao Povo Português nos seus limites geográficos quase iniciais, muito embora sejam para ele, naturalmente, a minha primeira dedicação e a minha fidelidade total. Se tal fizesse, faltaria à amplitude do Princípio que encarno, traço de união no tempo, permanência no desenvolvimento das circunstâncias, sinal de identidade nas separações. Embora na devida consideração pelas soberanias dos novos Países de expressão portuguesa, consciente de realidades bem patentes e da sua irreversibilidade, não poderia deixar de me dirigir aos respectivos Povos neste meu primeiro acto formal: jamais deixarei de olhar- vos, meus irmãos na expressão lusa, com a imensa afeição com que sempre o fiz, sem paternalismo, mas antes na perspectiva de quem, personificando valores comuns, vos encara e à Nação Portuguesa, como indissoluvelmente ligados. As nossas fisionomias nacionais não seriam o que são caso não tivéssemos vivido, durante séculos, um Destino comum. Nada conseguirá apagar esta realidade em todos nós! Ao ver, ao ouvir e ao sentir Portugal, vejo- vos, ouço- vos e sinto- vos sempre; foi sobretudo através das vossas Terras que nós, Portugueses, sentimos a Terra inteira. Tenho fé em que distinguireis um dia, serenamente, entre colonialismo e colonização (correspondente, esta, a movimentos naturais dos povos) e atingireis a conclusão de que Portugal foi no Mundo um obreiro de experiências ímpares, de que muito haveis beneficiado. Tenho fé em que encontraremos, no futuro, fórmulas de convívio também excepcionais, assentes no respeito pelos direitos dos Estados e cimentadas pelo património lusíada e pelas vossas culturas.
Desejaria de todo o coração que esta minha fé fosse partilhada por todos os Portugueses! Desejaria ver- vos, meus Compatriotas, completamente libertos de uma certa má consciência que, a dado momento, vos foi instilada... Má consciência que minou o justo orgulho por quanto, ao longo de séculos, foi tarefa colectiva Além- Mar. Desse sentimento de frustração, insinuado entre nós havia muito, aproveitou um processo de «descolonização» que, por mim, prefiro não qualificar; a Nação Portuguesa o fará, se acaso o não fez ainda, como também sucederá ou já sucedeu com os próprios Povos dos novos Países de expressão portuguesa. Em vós, saúdo a Grei magnífica, humilde e grande, sofredora e combativa, que na força das suas virtudes e na humana crueza dos seus defeitos marcou de forma excepcionalmente positiva uma presença por onde quer que tenha passado, escrevendo comunicação na História como mais ninguém soube fazê- lo.
Assim, dizendo, recordo certas Comunidades de raiz lusa, como Goa, Damão e Diu, e lembro dolorosamente o Povo de Timor, traído na sua aspiração de Portugalidade. Com mágoa funda e a mais fraterna solidariedade, dirijo uma saudação especial àqueles Portugueses das mais variadas etnias que, atingidos por um processo de descolonização sobre o qual não lhes foi feita qualquer consulta, sofrem entre nós, a amargura das suas vidas destroçadas e as dores da saudade: ânimo, meus Compatriotas, pois muito tereis a dar e a receber neste velho País! Sede pacientes e guardai a cabeça levantada pelo muito que haveis feito; os factos vos darão, também aqui, ensejo de utilizardes a grande riqueza da vossa experiência e da vossa abertura.
O equilibrado orgulho, a convicção de nós próprios, o sentido de uma identidade nacional são- nos fundamentais na fase histórica que atravessamos. Nenhum Povo digno desse nome se apresentou jamais perante a História ou perante a Comunidade Internacional como réu do seu Passado! Tal equivaleria a pedir desculpa de existir... É necessário que tenhamos consciência disso para podermos preservar a nossa fisionomia e realizar, sobre nós mesmos, um exame de consciência, uma reforma da mentalidade, direi mesmo uma pedagogia colectiva. Disso carecemos para conseguirmos, enfim, rever sem espírito destruidor, reconstruir sobre valores imperecíveis, dialogar sem a brecha da malquerença, reformular sem criar situações de vácuo, defender a liberdade sem resvalar para a demagogia. Nesta se instalam as tentações totalitárias e se insinuam os messianismos ditatoriais, que as gentes fatigadas e desejosas de ordem acolhem com natural alívio para, depois, perigosamente neles delegarem a consciência.
Ao dirigir- vos estas palavras, interrogo- me sobre se serão elas, efectivamente, as que muita gente esperaria ouvir de mim. Em consciência, sei serem as que me competem. Notai bem que não sou chefe político. Não me identifico com partido algum. Não procuro propagandas eleitorais, nem dependo delas. Não me cabe, em suma, fazer política na acepção comum da palavra. O Herdeiro dos Reis de Portugal não tem que pretender; ele detém a Representação imprescritível de um Princípio, cabendo- lhe aguardar quanto os Portugueses possam, porventura, decidir sobre as Instituições. Não cabe à Realeza imporse, mas sim escutar o chamamento do Povo. Não me cabe pois pretender; cabe- me estar ao vosso dispor. O Rei só se justifica como Chefe livre de uma Nação livre. Para que ele possa ser livre, é imprescindível que a Nação o consagre em liberdade, ou por amor da liberdade, como aconteceu com El- Rei D. Afonso Henriques, com El- Rei D. João I e com El- Rei D.João IV.
Nas circunstâncias actuais, cabe-me prestar em interessada abstenção o meu desvelo a todos os Portugueses, de quaisquer correntes políticas, desde que respeitem e preservem a independência da Pátria, sirvam o interesse colectivo, cumpram os deveres inerentes à cidadania, no usufruto da sua liberdade, respeitem a liberdade dos outros e reconheçam a dignidade transcendente da pessoa humana. Integrado neste Povo de que sou parte, cabe me servi- lo por todos os meios, consoante a lição recebida dos meus Antepassados e vivida no dia a dia da minha Família, com a elevação inerente à Instituição que personifico. Tal me obriga a uma dádiva aberta, a uma militância constante ao serviço do interesse nacional, a uma disponibilidade discreta mas atenta.
Assim Deus me ajude, fortalecendo- me na Fé Católica, como ajudou os Reis Fidelíssimos meus Avós. Pois creio interpretar quanto o Povo Português desejaria fosse, por parte do Rei, a compreensão do Princípio Real, caso um dia decida aclamá- lo.
Rogo a Deus vos tenha a todos em Sua Santa Guarda.
Lisboa, Março de 1977
Dom Duarte de Bragança
Rogo a Deus vos tenha a todos em Sua Santa Guarda.
Lisboa, Março de 1977
Dom Duarte de Bragança
Fonte: http://lusitana.org/
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Esta Mensagem é considerada como a do 1º de Dezembro de 1977 mas devido ao falecimento de S.A.R., Dom Duarte Nuno no dia 24 de Dezembro de 1976, só foi lida em Março do mesmo ano.
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